“Vou morrer. Ninguém vai morrer por mim. Quem vai me julgar hoje não vai deitar lá no caixão no meu lugar” Glória Maria, jornalista
Caro leitor. Era uma noite qualquer. Daquelas em que o corpo quer descanso, mas a mente insiste em zanzar pelas vitrines do mundo digital. Me vi presa naquele transe comum do Instagram, navegando por reels – esse novo modo de ver e ouvir o mundo em fatias rápidas, editadas para emocionar ou entreter. Até que um vídeo me parou.
Era Glória Maria. Sua voz firme, sem floreios, dizia: “Vou morrer. Ninguém vai morrer por mim. Quem vai me julgar hoje não vai deitar lá no caixão no meu lugar”. Uma bofetada existencial.
Nada de música dramática, trilha de fundo ou filtros. Apenas verdade. Tão densa, tão crua, que senti como se fosse uma confissão dirigida a mim. Confesso: não consegui seguir assistindo o segundo reel.
A frase martelava como sinos. E como todo bom texto, precisava ser vivido antes de ser seguido. Parei ali. Decidi que iria escrever algo sobre aquilo. Pois bem: não só escrevi, como hoje você está aqui lendo os meus alfarrábios.
Glória, que já se foi, disse o óbvio que teimamos em esquecer: a morte é pessoal e intransferível. E é por isso que a vida também deveria ser. Os julgamentos dos outros – que peso tem? Os dedos que apontam, os olhares enviesados, os comentários maliciosos ou as cobranças sociais – nenhum deles terá qualquer serventia quando a nossa hora chegar. Ninguém estará ali para substituir nosso último suspiro.
Mas ainda assim vivemos sob esse chicote invisível do julgamento. Quantas decisões são adiadas? Quantos projetos são enterrados ainda em fase embrionária? Quantas mulheres se calam, homens se anulam, jovens se curvam por medo da opinião alheia? Queremos ser aceitos, amados, aplaudidos. E esquecemos que, muitas vezes, isso exige que sejamos alguém que não somos.
A frase de Glória Maria é uma sentença libertadora. Um grito elegante de quem entendeu, na prática, o que significa viver com intensidade. E é aqui que ela se encaixa na reflexão que proponho hoje: até quando vamos terceirizar a direção da nossa própria vida?
O medo do julgamento nos escraviza. Mas o julgamento em si é uma ilusão. Quem nos julga hoje está ocupado demais com seus próprios abismos. E ainda que estivessem certos em alguma crítica, não seriam eles a colher as consequências das nossas escolhas.
Muitas vezes ouvi uma frase que diz que “o julgamento dos outros não paga as nossas contas”. Aliás, não paga nada: nem nossas dívidas bancárias, nem as existenciais. Aqueles que opinam sobre a nossa vida não carregam nossas dores, não conhecem nossos medos mais íntimos, nem enfrentam nossos dilemas éticos quando a noite cai. São vozes externas, mas não são bússolas.
A morte não aceita substitutos. Essa é a parte brutal. Mas é também a parte que pode nos libertar. Porque se vamos morrer sozinhos, então precisamos aprender a viver por nós, com consciência, com coragem e com uma certa rebeldia emocional. A rebeldia de dizer “não” ao que nos violenta e “sim” ao que nos constrói.
Talvez seja hora de uma reeducação afetiva. De nos colocarmos no centro da própria história. De reconhecermos que a única aprovação inegociável é a da nossa própria consciência. E de lembrarmos que o tempo passa. Que a vida urge. Que cada “sim” forçado dado ao mundo pode ser um “não” perigoso dado a si mesmo.
Volto à frase que me parou naquela noite: “Quem vai me julgar hoje não vai deitar lá no caixão no meu lugar”. Que esta reflexão posso lhe libertar, exatamente como me libertou. Porque viver não é agradar. Viver é assumir a autoria da própria biografia.
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