“Se uma pessoa é gay, busca Deus e tem boa vontade, quem sou eu para julgá-la?”
Papa Francisco
Caro leitor. Nesta segunda-feira, 21 de abril, fui surpreendida com a notícia da morte do Papa Francisco. Meu coração sangrou. Ainda que o acompanhasse à distância, pela mídia, e soubesse da sua fragilidade física aos 88 anos, havia em mim uma certeza silenciosa – a de que ele era imortal. Não por desafiar a biologia, mas porque algumas presenças no mundo parecem grandes demais para ser interrompidas por algo tão humano quanto a morte.
Sempre o achei extraordinário. Um papa de olhos lúcidos, fala firme, postura acolhedora e um senso de atualidade raro em instituições tão antigas. Era moderno sem ser banal. Aberto sem ser permissivo. Firme sem ser dogmático. Um líder espiritual que, mesmo enraizado na tradição, conseguia tocar as feridas do tempo presente sem medo.
Por duas vezes, nos últimos 12 anos de seu papado, estive no Vaticano. E junto a uma multidão com olhos marejados e fé em silêncio, eu o vi e ouvi. Sua voz serena cortava o vento da Praça de São Pedro com a leveza de quem compreende o peso da palavra. Ele não gritava, ele convencia. Não impunha, incluía.
Papa Francisco tornou-se um símbolo de um novo tempo para a Igreja, aproximando-se das realidades humanas com coragem. Não afastou os dogmas, mas trouxe à tona a humanidade escondida neles. Acolheu a comunidade LGBTQIA+ sem escândalo, sem reservas, com a naturalidade de quem compreende que julgar nunca foi um verbo compatível com o Evangelho. “Quem sou eu para julgá-la?” – disse ele, e nesse gesto, escreveu uma nova página na história da fé.
No documentário Francesco, lançado em 2020, defendeu o direito à união civil de casais homossexuais, sem temor ou tergiversações. Falou de inclusão onde antes só havia silêncio. E mais que isso: falou com ternura.
Sobre o aborto, em setembro de 2015, sua decisão foi igualmente revolucionária – sem espetáculo, sem histeria. “Conceder a todos os padres o arbítrio para absolver o
pecado do aborto àqueles que o possuem e a quem, com o coração constrito, busca o perdão”. Francisco humanizou o arrependimento. Ofereceu escuta em vez de culpa. E devolveu à mulher o que lhe vinha sendo roubado há séculos: o direito de ser olhada com compaixão.
Volto à epígrafe, agora com mais peso: “Se uma pessoa é gay, busca Deus e tem boa vontade, quem sou eu para julgá-la?” Que outro líder religioso de tamanha magnitude teve essa ousadia? Quantos transformaram o “quem sou eu” de julgamento em um gesto de acolhimento?
O Papa Francisco não morreu. Seu corpo partiu, é verdade. Mas quem conseguiu colocar humanidade dentro de dogmas e amor no lugar da condenação, não se apaga com o
tempo. Ele permanece em cada gesto de tolerância. Em cada perdão que supera a letra fria da norma. Em cada olhar de fé que se atreve a ser contemporâneo.
E por isso, mesmo chorando sua partida, ainda acredito na sua imortalidade. Porque os imortais, caro leitor, por óbvio, não morrem. Eles apenas descansam. E deixam conosco a missão de continuar – com lucidez, com coragem e, sobretudo, com amor.
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